terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

COMPORTAMENTOS DEFENSIVOS

Como é do conhecimento geral, quem sofre de dependência, seja substâncias psicoativas lícitas, incluindo o álcool e as ilícitas ou comportamentos, como o jogo, sexo, compras, co-dependência, distúrbio alimentar, furto etc. Só percebe que de fato está em apuros quando a dependência química se encontra numa situação avançada e em alguns casos ”fora de controlo” apresentando todo um conjunto de mecanismos (irracionais e disfuncionais) utilizados para manter o comportamento problema, seja consumir substancias ou jogo, comida, sexo, compras, gastar dinheiro.

O dependente químico na ativa utiliza todos os meios ao seu alcance para atingir os fins (prazer imediato, alivio, recompensa). Ninguém chega ao tratamento, com a sua vida organizada e feliz, bem pelo contrario. Com a agravante, de sua família (pessoas significativas) também estarem seriamente afetados psicologicamente pelo problema. Todos os membros são atingidos pelo problema. Isto significa que adotam, ao longo da progressão da dependência química, comportamentos problemáticos, disfuncionais e facilitadores. Tipo: evitar ver, sentir e confiar ou ainda a “regra do silêncio”.


Em uns casos mais extremos e dramáticos que outros, mas em todos, inclusive a família e amigos/as, sem exceção, experimentam e conhecem a impotência, a obsessão e a compulsão, a negação e a ambivalência, o sentimento de culpa e a vergonha, baixa auto estima, a raiva e o ressentimento, o medo e a angustia, a depressão e a ansiedade e o isolamento emocional. Neste sentido, o problema pode atingir proporções gravíssimas se não for abordado por profissionais competentes. Se não houver mudança nas rotinas, atitudes e comportamentos, nada muda.

Quando uma pessoa (homem ou mulher) que apresenta dependência química chega ao tratamento, sabe que algo precisa ser mudado nas suas atitudes e comportamentos. Esta realidade é incontornável e inequívoca. A permanência em tratamento é uma experiência profunda e significativa a nível emocional, mental e espiritual. No futuro, após completar o tratamento as coisas nunca mais serão a mesma.

Todavia, a maioria dos dependentes químicos adota alguns mecanismos de defesa (comportamentos) observados e adotadas em tratamento pelos residentes que reforçam a lógica dependência química.

Desculpas – Algumas afirmações “Eu consumo drogas/álcool porque me sinto deprimido.”

Culpar os outros - Culpar permite desenvolver ressentimentos, por vezes irracionais e descontextualizados. Permite colocar o centro do problema nos outros em vez de focar no comportamento problema da dependência química. “Com certeza você também consumiriam drogas se tivessem a/o mesma/o mulher/marido que o minha/meu.” Culpar centra-se no problema em vez de na solução.

Considerações problemáticas – Fazer considerações exageradas e distorcidas permite desviar o foco da atenção de forma a evitar resolver o problema. “Não vou às reuniões de Narcóticos Anônimos / Alcoólicos Anônimos porque aquilo é uma seita religiosa e antiquada.”

Otimismo exagerado – Evita enfrentar a realidade. “Bem, agora já estou melhor e consigo permanecer sóbrio, as minhas próprias custas sem a ajuda de ninguém.” A realidade, é diferente, ninguém recupera sozinho.

Mentira – Confunde, distorce e permite desviar a atenção do comportamento problemático. Afirmar algo que não corresponde a verdade.

Omitir – não revelar os assuntos importantes “fazer uso de meias verdades”.

Agradar/consentir – apresentar boas ideias, mas não ter intenção de as seguir ou pô-las em pratica.


Ridicularizar - Pôr os outros para baixo; criticas destrutivas, desviar o foco do comportamento problemático.

Ser especial e diferente – “De fato, ninguém me consegue compreender.” e “Tu falas assim, porque não passas te pelo mesmo que eu." e "Tu não és gay..., ou casada/o..., ou adotado/a...” “Como é que podes compreender a minha situação?! Tu és diferente, homem.../ mulher.../ preto.../ branco.../ esperto.../ estúpido.../ jovem.../ mais velho...”

Insinuar – Procurar as “fraquezas” de forma a obter algo dos outros. Controlar os outros, usá-los e manipular a situação para beneficio próprio. Por ex. “És o meu conselheiro / psicólogo favorito.”

Distração - “O meu problema com o jogo afeta-te ?! Então o teu problema com a comida também me afeta a mim.” (mudando o assunto e direcionar a discussão para outro direção)

Minimizar – “Eu não tenho problemas com o álcool. Só bebo 2 cervejas....” ou “Não tenho problemas com o jogo. Só jogo de vez em quando...e o dinheiro é meu."

Generalizar / vago – Não ser especifico de forma a evitar ser confrontado com as consequências dos seus comportamentos disfuncionais e irracionais. Quando questionado, responde “Talvez...”, “...de vez em quando.", “Acho que sim, mas...”, “Ocasionalmente...", "Provavelmente...”

Hostilidade /agressividade – Intimidar e agressividade e assustar os outros (dinâmicas de poder) de forma a que não seja contrariado. Tem sempre razão.

Jogos de Poder - Organizar subgrupos de forma a ter apoio para a sua raiva (ex. grupo de pares, “aliados” em terapia de grupo, companheiros de quarto).

Jogo da vitima – Ser o “rei bebê”, fazer-se de vitima.

Viver um “drama” / Excitação – É uma forma de distração que permite não se centrar em si mesmo.

Segredos e Mente fechada – Não permite dar-se a conhecer de forma a não receber ajuda dos outros.

Rigidez quanto a auto imagem – Desculpas para não mudar de atitudes e comportamentos – “Eu sou assim... e não vou mudar a minha maneira de ser, só porque vocês querem.”

Grandiosidade – Sensação falso de poder de forma a manter os outros afastados. “Eu consumia cocaína em grandes quantidades. Tinha tudo aquilo que queria e faço aquilo que bem quero. Ninguém manda em mim e não tenho de dar satisfações a ninguém sobre aquilo que consumo ou faço porque o dinheiro é meu.”

Racionalizar – Justificações e desculpas atrás de desculpas.

Passividade – Permanecer numa atitude “confortável” e “segura” por causa do medo da confrontação. “Eu não participo. Não disse nada porque não havia nada que eu pudesse fazer .”

Como é evidente, este tipo de mecanismos são abordados e avaliados, em tratamento pelos profissionais e pessoas significativas (quer seja em terapia individual, reuniões de família, e/ou em grupo) mas devem ser executados com respeito, dignidade, honestidade, compreensão, assertividade, feedback construtivo e empatia. Por vezes, não se justifica o desrespeito, a confrontação hostil, a humilhação como forma de “tratar” as pessoas, como ouço tantas vezes ser referida por residentes que passaram por outros centros de tratamento.

Não existem estudos científicos que demonstrem e confirmem a confrontação hostil e desrespeitosa como meio (ferramenta) valido para estes mecanismos, pelo contrario, reforça a defesa, a hostilidade, a baixa auto estima. Pelo contrario, os estudos revelam que os confrontos agressivos só reforçam a barreira da negação. Ninguém muda de atitudes e comportamentos se sentindo humilhado, castigado e desapoiado.

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