quarta-feira, 25 de março de 2015

O MEDO

"Eu sinto tanto medo que eu tremo. Sabe, é triste para uma mãe ter medo do filho". (Flávia - mãe)

O medo é um dos sentimentos mais presentes e marcantes na vida dessas pessoas e, especificamente, na expressão do grupo, ele ficou caracterizado em várias situações, associado à violência contra o outro e a si próprio, ao abandono, ao medo de cometer erros, de ter vida própria e de que aconteça algo ruim com o dependente químico.

A violência física resulta do efeito do uso das drogas em alguns dependentes químicos, ocasionando medo nos familiares e em outras pessoas com as quais convivem. Participantes como mães e esposa disseram que sentiam medo de serem agredidas fisicamente pelos familiares dependentes químicos.

O medo expresso pode estar associado, também, a respostas de violência dirigida ao parente dependente, desencadeada pela situação conflitante vivenciada no cotidiano doméstico. Desse modo, a codependência pode ser expressa pela sensação de ser capaz de responder com violência àquele ou àquela situação fora do controle do familiar. Nessa hora, entra em cena a sensação de dúvida e desconfiança de si próprio, geradas pela raiva, frustração ou mesmo fúria dirigida ao dependente químico ou autodirigida. Tal situação, não raro, termina em tragédia, conforme acompanhamos pelos media os relatos de homicídios ou suicídios cometidos por esses familiares. Sobre esse mesmo comportamento do familiar, é realidade que "muitos co-dependentes têm medo da própria raiva".

O contato com as substâncias psicoativas leva a diferentes tipos de violência, dentre elas a doméstica, de rua, gênero e até institucional. Dependentes químicos afirmam que a relação entre droga, violência e prazer é vivenciada por eles de forma conflituosa, e que seus familiares, quando cansados de presenciarem essa relação, sentem medo de intensificar situações geradoras de violência.

O medo de fazer algo contra si foi percebido quando um dos participantes falou sobre a possibilidade de praticar suicídio:

"quase toda a minha vida, que foi de 15 anos pra cá, pois hoje tenho 42 anos... e então, foi a minha adolescência, entrando na fase adulta todinha nisso, convivendo com as drogas. Então eu tenho medo de chegar à loucura e praticar o suicídio, por causa da impotência, do vazio e você não saber como lutar contra isso". (Vicente - irmão)

O familiar tem medo de ficar sozinho, da rejeição e do abandono do outro. Passa a utilizar artifícios inadequados e de maneira distorcida para que isso não aconteça.

Ter medo de cometer erros é uma das características da codependência que mais reprime, dificultando o processo de tomada de decisão perante toda a situação vivenciada.

Já o medo de se permitirem ser quem são, abrindo mão da própria vida, também foi observado nas experiências vivenciadas pelos familiares pesquisados.

No grupo, observamos a participante Janete, que expressou essa característica com maior clareza, pois estava feliz com a mudança em seu estilo de vida, mas tinha medo de viver essa nova vida. Um medo que nem ela mesma sabia decifrar, pois estava se redescobrindo, e essa redescoberta estava sendo vivenciada com muito temor, o que podemos perceber no discurso a seguir:

"Estou muito feliz com esse meu novo jeito de ser, mas estou com medo por não estar mais sentindo medo. Tenho medo do que pode acontecer." (Janete - irmã).

Essa aparente contradição expressa por Janete é vivenciada por muitos codependentes: quando passam a experimentar outras vivências que não a codependência, ficam com medo de que tudo volte e de que tudo não passe de fantasia.

E, por último, o familiar está sempre com medo de que aconteça algo de ruim com o dependente químico, que ele saia de casa e vá em busca da droga, recaindo. O medo da recaída culmina no constante medo do futuro, do amanhã.

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