Elis Rejane Busanello
Eu não sabia, mas antes do câncer, eu já estava doente. Duas doenças me limitaram mais do que a quimioterapia e a cirurgia. Os nomes delas são “Não Posso” e “Não Consigo”. Quando eu estava atacada do vírus “Não posso” eu dizia e agia assim:
- Não posso tirar foto de lado… Porque meu nariz e queixo são pontudos;
- Não posso usar saia curta… Porque meus joelhos são muito grossos;
- Não posso sorrir muito em foto… Porque meu bigode chinês aparece;
- Não posso andar de avião… Porque tenho medo.
- Não posso ter plantas em casa… Porque não sei cuidar.
E assim eu permanecia… doente de mim mesma.
Quando eu estava atacada do vírus “Não consigo” eu dizia e agia assim:
- Não consigo ficar bem nas fotos… Porque sempre arregalo os olhos;
- Não consigo pousar para fotos… Porque tenho vergonha; Meus dentes não são bonitos;
- Não consigo ler livros… Porque dá sono;
- Não consigo fazer caridade regularmente… Porque não tenho tempo.
E assim eu seguia, impondo-me limites…
Quantas vezes reclamei da oleosidade do meu cabelo, do quanto ele era fino e pesado. A escova não durava nada… Fiz até permanente para dar volume… fiquei parecendo um poodle.
Hoje, depois de encarar a doença, cheguei à conclusão de que o câncer mata muita coisa realmente… entre elas…Preguiça, vergonha, solidão, hipocrisia, futilidades, medos, culpas, limitações, radicalismos, carência, dependências, auto-crítica, intolerância, baixa autoestima e muito mais.
Neste processo conheci estas frases e elas definem o que acredito hoje: “O que somos é um presente de Deus. O que nos tornamos, é o nosso presente para ele.”
Não aprendi a voar. Isto é com os pássaros. Aprendi a me sentir como se estivesse voando. Descobri que a gente pode sorrir por fora e por dentro.
Ser diferente é muito diferente de ser esquísito, feio ou anormal. O silêncio pode ser melhor do que mil palavras. Conhecer a mim mesma é um aprendizado constante. Existe mais beleza nos processos e nas atitudes do que nas formas. É certo que o câncer muda a vida da gente, porém eu discordo que ele seja um presente. Ele é uma oportunidade!
Mas… Até quando precisaremos dele para percebermos as belezas que existem em nós e à nossa volta?
Quando me perguntavam: - Como você está?
Eu respondia: Bem careca, bem enjoada… Muito bem, bem, bem! Com bigode chinês… Com dentes nem tão bonitos assim… Sem vergonha… Com muita alegria de viver! Viver… E não ter a vergonha de ser feliz… Cantar e cantar e cantar… A beleza de ser um eterno aprendiz…
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